Sábado de aleluia e bacalhau

Gosto de observar e refazer mentalmente os trajetos das pessoas e das situações, quando pessoas e situações improváveis, de repente, se encontram e, de repente, dá certo. No sábado de aleluia, família longe, sete pessoas de lugares distintos se reuniram ao acaso, em minha cozinha, de forma improvável, quando paramos para pensar de onde veio cada uma delas. E deu certo.

As cozinhas tem este poder. Mas mais do que as cozinhas, a vida. Imagine todo o trâmite e os tropeços e senões da vida, para que sete pessoas cheguem a uma cozinha, em um sábado de aleluia: Um casal de virginianos é apresentado por uma amiga em comum, que ela conheceu via Internet. Era apenas um nickname, dez anos atrás, e calhou de vir falar de astrologia em uma janelinha em particular.

Um outro casal se conheceu na rua, quando ele, de madrugada, sabe-se lá porquê, resolveu dar dois passos atrás e, encorajado pela bebida, abordar (gentilmente!) duas moças sentadas num café. E eles se gostaram.

Uma amiga que gosta de romances, gatos e vinhos foi apresentada à outra por uma terceira que, àquela hora, estava a cerca de 2.000 quilômetros de distância. E uma outra dupla se conhece por acaso, em uma festa, e de repente ela descobre que ele é pai de um cara que ela já conhecia de algum lugar, e que acaso foi este?, ele também gostava de boa literatura e boa comida.

Sete pessoas se reunem assim, vindas de toda parte, bebem, comem e se divertem, e este momento despretensioso apenas revela todo o intrincado caminho do destino ou do acaso, no que quer que você acredite. Sete pessoas se reunem em torno de um bacalhau, que também fez seu próprio caminho dos mares gelados da Noruega ao Porto de Portugal, onde, infelizmente, foi morto, salgado e embalado para ser exportado ao Brasil.

Assim comemos uma bacalhoada, celebrando nossa pequena Páscoa, com conversas em torno do fogão e vinhos alegres e gelados. O cardápio deste dia foi meio português, meio brasileiro, com uma salada refrescante de folhas e pera, uma bacalhoada que inaugurou a panela de pressão e, para sobremesa, sorvete de queijo com calda quente de goiaba.

Segue o passo-a-passo deste dia de encontros improváveis:

Para a salada, rasguei folhas de alface americana e radichio; acrescentei lascas de pera após pingar nelas algumas gotas de limão siciliano e, por fim, decorei com lascas de queijo parmesão e um fio de azeite.

Para a sobremesa, pensada de última hora, comprei um sorvete sabor queijo e servi com uma calda de goiaba quente. A calda você pode fazer com açúcar e goiaba, se estiver disposto a passar alguma horas em frente ao fogão. Como eu tinha um pouquinho de pressa, comprei uma geleia pronta e, com um pouco d´água, em uma pequena panela, modifiquei seu ponto em alguns minutos de fogo alto e a servi ainda quente, por cima do sorvete. Ficou bastante respeitável. :)

E à bacalhoada, como manda a receita portuguesa e um pouco de bom senso e conhecimentos gerais:

Bacalhoada

1 kg de bacalhau dessalgado
6 batatas em fatias grossas
1 pimentão verde em tiras
2 cebolas em rodelas finas
2 dentes de alho picados
3 tomates sem pele picados em cubos
100 grs. de azeitonas pretas sem caroço
Quanto baste de salsinha picada
Pimenta-do-reino, sal e azeite a gosto

Se o bacalhau for salgado, deixe-o de molho de um dia para o outro, trocando a água pelo menos quatro vezes. Ferva o bacalhau para facilitar a sua limpeza, retire as espinhas e corte-o em pedaços grandes. Numa panela de pressão, regue o fundo com azeite e faça camadas com os vegetais e temperos e os pedaços de bacalhau. Prove o bacalhau para verificar o sal e acerte neste momento. Regue com bastante azeite, feche a panela e acenda o fogo alto. Quando começar a apitar, abaixe o fogo e conte 15 minutos. Espere sair o vapor, abra a panela, coloque o conteúdo em um refratário, aproveitando apenas um pouco do caldo que se formou, para não ficar muito aguado. Coloque no forno por alguns minutos, apenas até dourar levemente as batatas, e sirva com arroz branco.

Esta medida serve cerca de seis pessoas.





Comentários

  1. Grória! Que poético...rs...
    Foi ótimo e o post tá lindo!
    Quaaase dá pra sentir o cheiro delicioso da comida e o gostinho dos vinhos gelados!!
    Bj!

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  2. Pessoas inteligentes, papos divertidos e uma comida deliciosa... Não há melhor receita para o cultivo de antigas e novas amizades...

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  3. Acasos maravilhosos e um bacalhau perfeito, combinação mágica, que me deu um gostinho de casa, mesmo tão distante, e a satisfação de novas amizades. Voltei ter 15 anos, pelo menos nos prazeres desta vida, principalmente no pecado da gula. Obrigado por uma tarde tão especial.

    Beijos do Dan, o cara bêbado da madrugada!

    Valeu!

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